sexta-feira

A pele que habito

Almodóvar faz arte e disso ninguém duvida.

E é de uma verdadeira forma artística que ele se expressou conosco através dessa obra-prima que é "A pele que habito". Sai muda, introspecta, após o filme. Pensei: "o que esse cara fez?" "Não é possível!" "Ele fez isso comigo?"

Cenas fortes e memoráveis, ótimos atores (em especial, Antonio Banderas que deu um verdadeiro show de interpretação em espanhol, sua língua mãe. Também não posso esquecer a lindíssima atriz espanhola Elena Anaya. Um deleite visual explorado em série de close-ups nos quais se revela por meio de olhares  ora resignados , ora selvagens, ora os dois. Um misto de beleza, ingenuidade, ternura e sofrimento. Ela deu conta de uma interpretação incrível, uma verdadeira revelação no papel principal.), uma belíssima e de bom gosto trilha sonora, e um enredo a-temporal, bem construído, que nos prende do início ao fim. Não estou lhes falando da indústria de entretenimento hollywoodiana. Estou lhes falando de um Filme de Verdade. Cinema. Pura Arte.

Um cientista louco numa obra de Mary Shelley. Um novo Franskestein. O criador e a criatura. Tragédias familiares. Vicente. Vera Cruz. O masculino. O feminino. Identidades Sexuais. Estupro. Loucura. O Tigre. A Pele perfeita. Ciência. Mortes. Sangue. Amor. Vida. Bioética. Religião. Moral. Existência. Vingança. Traição. Solidão. Pilates.Ópio.Tudo isso não diz nada quando nos deparamos com o formato que o filme foi filmado, com os ângulos perfeitos, com os cortes que nos levam a ter inúmeras suposições sobre o que parece verdade e não é.

Impossível dar conta de um filme tão complexo  num  texto tão simples.

Mais que uma indicação: uma obrigação. Saia de sua poltrona agora e vá assistir. Já viu? Veja de novo. É o que vou fazer.



Um comentário:

  1. Ricardo Viana, Professor de Filosofia, escreveu-me o seguinte comentário por e-mail:


    E mais, no "A pele que habito" Almodóvar conduz toda trama com um martelo: destruindo e concomitantemente esculpindo algo demasiadamente humano, mas que contrapõe aos pressupostos da moral judaico-cristã. Sua ousadia consiste numa verdadeira tresvaloração de todos os valores. Aí consiste o verdadeiro papel da arte: transcender à realidade para irmos a encontro de nós mesmos; permitirmos a tragédia para regozijarmos com nossos dores e nossa fortaleza; tocar no ponto vermelho que se encontra no poço cristalino de nossas convenções; estabelecer um simpósio entre o bem e mal e levarmo-nos à exteporaneidade, ao imtempestivo. E, enfim, quando valtarmos à luz teríamos feito nossas catarses,

    Almodóvar é isso, um Nietzsche da cinematografia que agrega a coragem do professor da Basiléia com a audácia de Sade, permeada pela micofísica foucaultiana e refletida no existencialismo sartreano. Ele consegue fazer tudo isso, sendo único no que faz.

    Vamos complementando tais elucubrações...

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