sábado

DIREITOS FUNDAMENTAIS DAS MULHERES NO PERÍODO PANDÊMICO

 

LANÇAMENTO:



APRESENTAÇÃO

 

“As sociedades mais atrasadas são aquelas em que as mulheres estão submetidas. No entanto, essa verdade evidente é frequentemente ignorada pelos governos e pelas organizações sem fins lucrativos. Por sorte isso está mudando à medida que mais mulheres têm poder de decisão política ou recursos para a filantropia, que em geral são destinados a projetos femininos”. Isabel Allende. In: Mulheres de minha alma. Pág. 137

 

            A presente obra coletiva traz abordagens que se relacionam diretamente com os direitos fundamentais das mulheres. Os artigos estão contextualizados no período do enfrentamento à maior pandemia vivenciada por nossa geração e que trouxe inúmeros problemas que se ligam com a vida e os direitos das mulheres. Os 16 artigos dessa coletânea possibilitam diversos olhares e são continuidade às obras coletivas “COVID-19 e Direito Brasileiro: mudanças e impactos”, “Pandemia e mulheres: volume 01 e 02”, “Maternidade e Direito”, “Maternidade no Direito Brasileiro”, vez que como organizadora desses trabalhos, que contaram com muitas vozes e mãos, pesquisas e denúncias, apoio coletivo, estamos numa batalha coletiva por uma visibilidade sobre a questão dos direitos das mulheres.

            Com a publicação de “Pandemia e Mulheres: volume 01 e 02”, com mais de mil páginas de escrita coletiva, evidenciou-se que os reflexos da pandemia nesse grupo vulnerado teve, e continua a ter, muito impacto. Com essa visão sustentada nas pesquisas destas duas obras fizemos uma divulgação do material que contou com o apoio da ABRACRIM, que além de ter promovido lives para encontros discursivos sobre a temática, também possibilitou que os artigos tivessem um alcance maior, através de seu site. Paralelamente, foi criado o Observatório das Mulheridades, em algumas plataformas virtuais, a exemplo de conta no Instagram e blog com o mesmo nome, atuando durante o período eleitoral, com o intuito de contribuir para o debate político, vez que em outubro de 2020 tivemos uma importante eleição para os municípios brasileiros e a pauta dos direitos das mulheres era (é) premente.

Com isso, abrimos diálogos com mulheres parceiras do projeto de escrita para dar visibilidade a candidaturas comprometidas com os direitos das mulheres, como Nilda Câmara, Mirian Monte e Andrea Marques. Todas três feministas, com propostas inclusivas e sociais.

Nilda Câmara, professora aposentada da UFCG, desde os anos 80 já participava ativamente dos movimentos populares. Sua candidatura foi indicada por um grupo de mulheres do Partido dos Trabalhadores. Por respeito e cuidado com a saúde do Outro, a própria saúde e de sua família, fez toda a campanha via redes sociais, contou com um grupo de 50 pessoas que apoiaram a candidatura, recebeu depoimentos de agradecimento por ouvir vários setores da sociedade, e por ter a coragem de se colocar como candidata. Obteve 844 votos, sendo a segunda mais votada do PT em Campina Grande, porém não foi eleita. Em 2020, Andrea Marques foi candidata pela 1ª vez ao cargo de vereadora na cidade de Salvador pelo partido Rede Sustentabilidade. Em 2018, tentou a vaga de deputada estadual pelo Partido Verde. Obteve muito menos votos que o esperado e percebe que há muitas dificuldades para que as mulheres façam política na atual conjuntura. A voz da mulher na política, mesmo potente, requer ouvidos atentos, mas esses ouvidos estão tão acostumados com o machismo, com o patriarcado, com o universo capitalista opressor, que sequer percebem as práticas perniciosas dentro da própria estrutura partidária. Pela sua experiência, a existência e a permanência das mulheres na política é muito difícil, sendo necessária uma verdadeira alteração na formação da estrutura social. Acreditar na possibilidade dessa mudança e apoiar verdadeiramente as mulheres nos espaços políticos, é o primeiro passo para o fortalecimento da mulher nas eleições. Mirian Monte, candidata à vereadora em Maceió, analista judiciária, aliou sua poesia e arte às suas bandeiras políticas. Apesar de bem votada, também não se elegeu, mas hoje exerce a Presidência da Fundação Municipal de Ação Cultural de Maceió e, portanto, está com atuação na esfera pública. Acompanhando a atuação política destas três mulheres, no contexto pandêmico, ficou evidente o quanto de dificuldades tiveram para fazer suas campanhas pelas vagas no legislativo.

A questão política tem total relação com o contexto da pandemia, vez que se não tivermos representantes com esse olhar inclusivo e aguerrido com os direitos fundamentais das mulheres, os problemas que as envolvem se agravarão, pois se trata de grupo vulnerado historicamente e no contexto atual lidam com questões que envolvem sobrecarga do trabalho doméstico, falta de estrutura escolar para suas crianças, desemprego crescente, cuidado com os infectados com o vírus da COVID-19, violências e direitos reprodutivos.

Essa obra é um mosaico de temas ricos e diversificados sobre a necessidade do compromisso da atuação jurídica com perspectiva de gênero e preocupada com os grupos vulnerados socialmente, dando evidência à questão das mulheres. Precisamos unir forças, ocupar espaços públicos de poder, fazer campanhas, mudar legislação, ofertar capacitação em gênero para o judiciário, acabar de vez com o patriarcado cruel e melhorar as condições de vida de tanta gente que está sofrendo as consequências danosas de uma ferida histórica e pela falta de gestão de problemas que foram agravados pelo vírus da COVID-19.

É nessa perspectiva de reconhecer problemas, denunciá-los, que essa obra se constrói. Em cada fase da pandemia, mais complexas as situações se mostram. Agora, vivenciamos a fase das poucas vacinas que atrasadamente, e sem planejamento, estão sendo distribuídas à população. Essa obra é uma contribuição para o debate dos direitos fundamentais das mulheres tomando como pano de fundo o contexto histórico da pandemia, que está muito longe de ser superada e há indícios fortes que no nosso país a necropolítica e a corrupção galopam juntas nos pastos da desordem e do atraso. Faltou dinheiro para pesquisa, para vacinas, para ciência, contrariamente tem sobrado para a indústria das fake news negacionistas e alienadoras. Falta clareza e informações confiáveis sobre a pandemia, especialmente diante da decisão do governo federal de restringir o acesso a dados, de tornar muitas informações sigilosas. Uma obra dessa natureza é um ponto de luz na escuridão da desinformação. É uma gota d’água diante do caos oceânico que vivenciamos no mundo e nos direitos das mulheres.


Ezilda Melo

quinta-feira

Pluralidades do sentir: artes plásticas, dança e teatro no direito brasileiro


A coletânea “Pluralidades do Sentir: Artes Plásticas, Dança e Teatro no Direito Brasileiro” compõe-se de 27 ensaios escritos por 38 autores que analisam pela lente jurídica diversas manifestações de artistas brasileiros, desde as artes plásticas, passando pela dança e pelo teatro.

É uma obra rica de significados, escrita por muitas mãos e corações. Nossos autores são pessoas imbuídas de levar emoção e afeto para o Direito. Trazem a perspectiva teórica de eleger na cultura brasileira o diálogo para leituras novidadeiras.

O movimento que se pretende é mostrar que a perspectiva da leitura do direito pelas artes fortalece novos lugares de pensar e sentir, além de mostrar a importância das construções artístico-culturais produzidas por nosso povo. Na década de 70, portanto há 50 anos, o escritor paraibano Ariano Suassuna idealizou o Movimento Armorial que, em linhas gerais, tinha a pretensão de valorizar a arte genuinamente brasileira.

Vemos muitas propostas que relacionam o Direito à Arte. Porém, não poucas são as junções que enfocam as artes e os cânones estrangeiros. Mais uma vez caímos no colonialismo e na exacerbação da valorização do que vem de fora, do que é produzido em outros países. Se existe um elemento essencial para conhecer seu povo, sem dúvida alguma, a arte figura no topo dessa leitura de códigos de conviviabilidade e sociabilidade.

 Perquirir à arte brasileira que direitos estão ali de forma real, ausente, imaginada, como possibilidade futurística, é um exercício hermenêutico potente que, dentre outras coisas, permite verificar que o direito é, antes de mais nada, uma expressão cultural de seu povo. Valorizar nossas produções artísticas, conceber que podem nos fazer refletir, ensinar e aprender, pode contribuir para uma sociedade mais igualitária.

As cidades brasileiras com bibliotecas, livrarias, teatros, encontros literários, rodas de leitura, incentivo à produção cultural nos mais diversos segmentos artísticos, saraus, festivais de dança, mostra de arte são poucas e estão concentradas nas capitais. Nos interiores de nosso país, a arte e os direitos sociais chegam com muita dificuldade. Há muitas cidades que sequer possuem uma delegacia das mulheres, nem possibilidade das violentadas pelo patriarcado se expressarem artisticamente. É preciso ter esse olhar atento e lutar por uma sociedade inclusiva. É essa a função das leis e da aplicação do direito nos casos concretos. Uma sociedade que se preza, valoriza arte e artistas; valoriza toda a multiplicidade cultural e todos aqueles excluídos por questões que envolvem gênero, raça e classe social.

O Direito encontra na Arte um ancoradouro, uma rodovia, uma ponte, um caminhar. Desse encontro, nascem castelos, periferias, muros, palcos, existências, expressividades e coletividades.

Trazer a Arte para o Direito é mais do que um exercício de sensibilidade. É uma prática de coerência com o que se faz e se escreve, com o que se fala e se vive. Não adianta pregar uma coisa e fazer outra. Falar que defende minorias e apoia governantes massacrantes, políticos corruptos, candidatos machistas, misóginos, racistas e preconceituosos. A incoerência permite que governantes autoritários, com verdadeiro espírito de subordinar o coletivo através de múltiplas violências sociais e simbólicas, cheguem ao poder e sufoquem as artes dos menos favorecidos e até dos artistas consagrados, perseguidos quando não os apoiam.

 Viver da arte e para a arte nunca foi fácil. Essa valorização começa desde a educação para essas experiências. Poucas são as escolas brasileiras que se preocupam com o desenvolvimento artístico de seu alunado.

Nossos artistas mirins precisam de incentivo, de possibilidade do encontro com a arte. Se não tiverem essa oportunidade na infância, mais difícil será encontra-la na idade adulta. São muitas matérias que veiculam que nossos jovens cada vez leem menos e mal. Somos bombardeados por uma sociedade que destila ódio em matérias e postagens mentirosas. As formas de expressão artística são lugares combativos de opressão e de marginalidade, permitem o desenvolvimento da criticidade e da criatividade.

 Na arte encontramos o mundo e ele nos sorri com estupefação. É na arte que podemos fazer leituras dramáticas das denúncias das violências sofridas pelas mulheres, é na poesia que vivenciaremos todo sentimento do mundo, na música que escutaremos as dores e ouviremos os silêncios das vozes silenciadas, é no imaginário das telas que a plasticidade do mundo se apresenta em cores, é na dança que sentiremos nossas expressões corporais em ebulição, é no palco que veremos personagens que falarão conosco de uma forma tão pessoal que saberemos quem realmente somos, o que faríamos em determinadas situações, nossas intolerâncias para agressões, identificações com nossas idiossincrasias e pulsações no âmago de quem somos. Se assim não o for, a arte é somente um lugar de prestígio para quem pode comprá-la e adquiri-la, para quem pode ir ao Louvre, para quem só enxerga os artistas e museus europeus e norte-americanos. Conhecimento sobre eles é relevante. Visitar, para quem tem condições financeiras de sair do país, faz parte do roteiro cultural, mas se importar que numa cidadezinha do sertão de qualquer Estado do Nordeste não tem um cinema na cidade, não tem um teatro, não tem apoio aos artistas locais, é exercício de cidadania, de liberdade, igualdade e fraternidade. São princípios basilares duramente conquistados em revoluções europeias e longe de existirem por aqui, nesse espaço geográfico que chamamos Brasil. A arte enquanto bem de consumo de difícil acesso é excludente e esse discurso aparece com força no Brasil atual, onde o governo federal quer que fique mais caro, com taxação dos livros, por exemplo.

É, por tudo isso, que precisamos reconhecer a importância social da arte enquanto modo de conquista de direitos.

A arte é encontro de si e motivo para continuar.

Que essa coletânea que fala das artes brasileiras seja lida, que alcance e que possa provocar olhares inclusivos. Que possa inspirar pesquisadores a olhar o Direito brasileiro numa perspectiva cultural, que possa valorizar as artes esquecidas de grupos fora dos eixos controladores da produção artística e que elegem os melhores que devem ser ouvidos, vistos e apreciados. Que essa obra seja propulsora de energias novas que ofusquem as formas de opressão contra mulheres, negros, indígenas, sertanejos, nordestinos, nortistas, ciganos, semitas, amarelos, LGBTQI+, pessoas com deficiências e todas a diversidade secularmente excluída. Que esses grupos sejam lidos, incentivados a falar, que se leia, ouça, veja quem nunca foi visto, lido, ouvido. É dessa substituição da ausência pelo pertencimento que precisamos lutar.

Que sejamos plurais e com perspectiva transdisciplinar de fazer assimilações com as ciências num exercício que coloca na obra aberta quem somos, num exercício de alteridade e fraternidade.

Que “Pluralidades do Sentir: Artes Plásticas, Dança e Teatro no Direito Brasileiro” exale novos ares.

De renovação!

 

ISBN: 9798597959986


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sábado

Pandemia e Mulheres - volume 02


 Capa dos volumes 01 e 02: Lia Testa


Em continuidade aos volumes da Coleção “Pandemia e Mulheres”, trazemos essa coletânea a público com a certeza de que pode contribuir para a construção de políticas públicas. A gestão do coronavírus é o cenário que se mostra.

Os números oficiais apontam que de março para cá, agosto de 2020, morreram no Brasil mais de 100 mil pessoas vítimas da COVOD-19 e mais de 3 milhões de casos foram confirmados. Sabemos que esse número está camuflado em razão das subnotificações. A quantidade de brasileiros mortos, tudo leva a crer, é bem maior. É um número tão expressivo, comparativamente à outra doença que também não tem vacina e é viral, que equivale à quantidade de pessoas que morreram vítimas da AIDS em nove anos aqui no Brasil. A velocidade com que estamos perdendo nosso povo se mostra estarrecedora. Em cinco meses o estrago tem repercussão catastrófica. “Isso é inédito, algo que nunca teve. Deveríamos estar em desespero, isso é uma tragédia como uma guerra de verdade, um conflito armado. Mas o Brasil está em uma anestesia coletiva", diz o infectologista José Davi Urbaéz, porta-voz da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI). Já Alexandre Naime, chefe do departamento de Infectologia da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual Paulista (Unesp), afirma: “a Covid-19, dentro do cenário de saúde pública, é um dos mais importantes fenômenos da história do Brasil. É difícil uma doença aguda, tirando a gripe espanhola, que tenha levado tantas vidas em tão pouco tempo".

Porém, diante desse terror pelo qual passamos, há um total descaso do Governo Federal com as mortes e com a própria pandemia, que já foi chamada até de “gripezinha” pelo Presidente da República. A doença é grave e urgente é a articulação dos entes federados para controle adequado da COVID-19. De acordo com Emilio Sant'Anna, em matéria para a Folha de S. Paulo, neste momento da Pandemia, o Brasil fica atrás apenas dos Estados Unidos (160 mil) em número de óbitos. Ao considerarmos que a população dos EUA é 57% maior (330 milhões ante 210 milhões), os índices chegam a ser similares. Apenas 5% dos 5.570 municípios brasileiros, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), têm mais habitantes do que essa multidão de mortos que o coronavírus formou. E só 92 delas ainda não tinham, até primeira semana de agosto de 2020 nenhum caso registrado de COVID-19.

É como se um estádio como o Maracanã totalmente lotado e mais 22 mil pessoas na fila, morressem de uma vez. Essas pessoas não compõem apenas uma lista tétrica: são familiares que agora sofrem em luto, são uma centena de milhares de vidas e histórias que se foram, muitas na obscuridade dos dados, em um emaranhado de dúvidas nos quais os protocolos sanitários-médicos são confusos. Diante de uma lacuna sobre quem são os cem mil mortos vítimas da COVID-19, diante da falta da porcentagem por gênero, raça e cor, dados que ainda não foram divulgados, muitos coletivos de mulheres no Brasil todo estão disseminando informações para dar visibilidade à uma questão que já levantamos no volume 01 desta coleção: numa crise, qualquer que seja ela, as mulheres são as mais vitimadas.

Diante deste silêncio e desta omissão pública, resta aos movimentos de mulheres e dos demais grupos vulnerados, procurarem por si sós, instrumentos para dar visibilidade e legitimidade para pautas urgentíssimas e procurarem unir forças para sair desta situação. Com o objetivo de trazer informações sobre a situação das mulheres no contexto da pandemia, até final de 2020 teremos recebimento contínuo de artigos para os volumes desta coleção que sairão em setembro, outubro, novembro e dezembro. Para tanto, autores devem encaminhar material para o e-mail pandemiaemulher@gmail.com, com textos de até 20 páginas, que tratem exclusivamente das múltiplas situações vivenciadas pelas mulheres brasileiras das regiões da federação que estejam relacionadas aos problemas enfrentados diante das consequências catastróficas da pandemia. Os textos para as obras serão recebidos até dia 10 de cada mês, portanto para o Volume 03 o material deve ser enviado até dia 10 de setembro de 2020 e assim sucessivamente. Quanto mais local os dados apresentados mais importante para a criação deste mosaico, que por ora é bastante nebuloso. Diante deste panorama, propomos mais um observatório para ajudar no planilhamento destes dados e sugeriremos propostas políticas neste ano eleitoral para mulheres candidatas que se conectem com essa preocupação. Trata-se do “Observatório das Mulheridades”, que nasce da necessidade de sistematizar informações, problematizar situações e apontar soluções para melhorar as condições das mulheres vulneradas, em qualquer contexto que seja, durante a Pandemia do Coronavírus. Este projeto contará com blog, instagram, canal de YouTube, podcast e fará ciclo de palestras com as pessoas participantes do projeto coletivo.

Depois de feita essa abordagem que apresenta o momento atual da pandemia no Brasil a partir do número cruel de cem mil mortos e da apresentação sobre os próximos volumes da escrita da coleção e a criação do Observatório, passaremos a fazer breves análises sobre cada um dos artigos que compõem o volume dois de Pandemia e Mulheres.

Temos 42 artigos, escritos por 86 pesquisadores brasileiros, em sua grande maioria da área jurídica, apesar de termos um debate transdisciplinar nos textos que aqui se apresentam. São arquitetas, advogadas e advogados, psicólogas, professoras e professores de diversas áreas, artistas plásticas, engenheiras civis, biólogas, poetas, historiadoras, administradoras de empresa, terapeutas, procuradores do Estado, sociólogas, atrizes, funcionários públicos, assessores jurídicos, assistentes sociais, advindos das seguintes instituições UCSAL-Salvador, Faculdade Baiana de Direito, Universidade Estadual da Bahia, Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, UFBA, OAB/BA,UERN, UFRN, OAB-RN, UEPB, UFCG, UFPB, OAB-PB, UNICAP, UFPE, OAB-PE, Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular Aqualtune-UFAL, CESMAC, Instituto Negro de Alagoas, Universidade Tiradentes-Propriá, IFTO, Universidade Federal do Pará, PUC-RS, UFPR, Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP), Unilasalle-RS, Universidade Estadual do Centro-Oeste no Paraná,  PUC-Minas, Universidade Estadual de Montes Claros-MG, OAB-RJ, Universidade Federal de Minas Gerais, Universidade Estadual de Londrina, Universidade de São Paulo, UFRJ, UFG, UFOP, Uniaeso, Associação Brasileira Profissional pela Saúde Integral de Travestis, Transexuais e Intersexos – Abrasitti, Associação Visibilidade Feminina, Conselho Municipal de Políticas para Mulheres da Prefeitura Municipal de São Paulo, Rede Brasileira de Direito e Literatura, ABRACRIM Mulher, Associação Brasileira de Advogados Criminalistas, Instituto Brasileiro de Ciências Criminais do RJ,  Núcleo de Estudos e Defesa dos Direitos da Juventude e Infância-NEDDJI/I (SETI/UGF), Comissão da Diversidade Sexual e de Gênero da OAB/Santo Amaro-SP, Laboratório de Política, Comportamento e Mídia na PUC-SP, Programa Mãe Coruja, IDASF, Fundação Araucária (PIBIC/UENP), Políticas Públicas de Gênero da Prefeitura Municipal de São Paulo, TJ/SE, UniSantaCruz.

 As produções advieram dos seguintes Estados da Federação: Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Paraná, Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro. Portanto, ainda não conseguimos trazer discussões sobre algumas áreas geográficas do país. Queremos artigos de pesquisadores de todos os Estados brasileiros. Para tanto, é necessário darmos visibilidade ao divulgarmos a obra e estendermos o convite para publicação aos colegas de outras instituições do Acre, Amazonas, Amapá, Tocantins, Roraima, Rondônia; Ceará, Maranhão, Piauí; Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Distrito Federal; Espírito Santo; Santa Catarina.

No volume 01 tivemos 36 artigos e participação de 78 autores. Juntando volume 01 e 02 temos uma produção acadêmica de quase mil páginas tratando eminentemente da relação das mulheres brasileiras no contexto da pandemia. Trata-se de algo muito importante que foi conseguido graças aos esforços coletivos de todos que compõem as obras iniciais deste projeto, que está sendo feito voluntariamente por quem assina essas produções científicas. São pesquisadores de várias instituições de ensino do país e há uma demonstração clara de que as mulheres estão em situação de maior vulnerabilidade no contexto pandêmico. 

No artigo Yabás invisibilizadas e a COVID-19: uma carta-denúncia em defesa das mulheres quilombolas do Estado da Bahia, escrito por Andreza Rodrigues, Bruna Galvão Severo, Carla Estela Rodrigues, Maísa Conceição Lobo, as autoras apresentam uma carta-denúncia para ensejar uma maior consciência sociopolítica do país para que as mulheres quilombolas e suas famílias, possam viver em condições dignas e que possam ter suas vozes ecoadas no espaço social, que possam ter seus corpos lidos como sujeitos de direitos e não invisibilizados ou socialmente submissos.

No artigo “A pandemia invisível: um olhar sobre a violência de gênero contra mulheres migrantes e refugiadas em tempos de covid-19 a partir da experiência de um projeto de extensão universitária”, escrito por Tatyana Scheila Friedrich, Elaine Cristina Schmitt Ragnini, Priscila Ferreira Fortini, Manuela Busato, Isbeline Theodorice, Julya Naara, Nara Veiga Borges, Tania Savariego, Taís Vella Cruz,  Victória de Biassio Klepa, as autoras expõem casos no contexto migratório onde se percebe a incidência de várias formas de violências, dando contornos específicos que ainda não foram descritos ou amplamente discutidos pelos órgãos públicos e serviços que trabalham com mulheres e/ou com migrantes.

Em “Mulheres, racismo e pandemia: perspectivas sobre direitos humanos em um contexto de crise”, as autoras Elita Isabella Morais Dorvillé de Araújo, Mariana Cândido dos Santos,  Mayara Alessandra dos Santos Barros apresentam os dados alarmantes de violência de violência contra mulher no Brasil e em Alagoas referentes ao período da pandemia em que se instaurou o isolamento social, valendo-se dos dados oficiais fornecidos pela Secretaria de Segurança Pública, e da Nota Técnica Violência doméstica durante a pandemia de COVID-19 feita pelo Fórum de segurança pública, trazendo os apontamentos nacionais. Mostraram que a população negra é quem fica cada vez mais vulnerável e sem acesso aos direitos básicos de sobrevivência, e que somente com uma crítica ao neoliberalismo, e contributo no feminismo negro, podemos ampliar a visão deste problema.

Em “Pandemia, a mulher e seu duplo isolamento”, Elton Dias Xavier e Kristianne Veloso argumentam que as mulheres sofrem, no contexto pandêmico, um duplo isolamento, primeiro aquele ao qual todos estão submetidos; depois, o isolamento proveniente da sua condição de mulher, marcadamente como objeto da recusa à igualdade e da submissão insubmissa que afetam, de forma especial, à mulher por sua própria condição e gênero.

Érika Thomaka e Maíra Fernandes em “O aumento do número de casos de violência doméstica: efeito deletério da quarentena” falam sobre o Projeto de Lei n.º 1.444/2020, o qual prevê uma alteração na Lei Maria da Penha para determinar que, durante a emergência de saúde pública decorrente da pandemia do coronavírus, a União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios assegurem recursos extraordinários emergenciais para garantir o funcionamento das Casas-abrigo e dos Centros de Atendimento Integral e Multidisciplinares para Mulheres. conclamam para que seja aprovado, com a brevidade que a situação de calamidade requer.

Ezilda Melo escreveu dois artigos. No primeiro intitulado “A COVID-19 no Brasil e as mulheres: uma pandemia sexista, classista e racializada” afirma que a pandemia não é a mesma para todos os grupos sociais, nem também é a mesma para todas as mulheres. Aponta para uma sociedade pós-pandemia livre do machismo e do racismo como necessária para que continuemos a existência humana. Já no artigo intitulado “Análise de normas jurídicas relacionadas à mulher durante a pandemia da COVID-19 no Brasil” nos diz que os problemas relacionados às temáticas de Violência, Saúde, Economia e Trabalho necessitam da nossa total atenção. Diz ainda que a estruturação dos moldes modernos de uma economia neoliberal, que valoriza acumulação e o descarte humano, passa por cima da importância do trabalho na construção do sujeito digno com direitos trabalhistas, previdenciários e com poder de compra para o seu mínimo existencial. Para as mulheres em confinamento, a sobrecarga de trabalho se intensificou, e alguns casos vieram acompanhados da violência que permeia muitos relacionamentos afetivos, ampliando a desigualdade entre trabalho produtivo e reprodutivo. Em seguida fez um mapeamento e análise de normas jurídicas relacionadas à mulher durante a pandemia da COVID-19 no Brasil. Sequenciou e analisou as principais alterações, de março a julho de 2020, de leis que impactam diretamente na vida de mulheres, seja em caso de violência doméstica ou em caso de emprego. Percebeu que quanto ao disciplinamento federal sobre as mulheres grávidas e lactantes que estão encarceradas, não há nenhuma alteração legislativa, o que representa uma lacuna perigosa.

Fe Maidel e Rachel Macedo Rocha no artigo “Os desafios do cuidar e ser cuidada - estratégias de acolhimento das mulheres trans durante a pandemia trazem o registro da sobrevivência de mulheres transexuais e travestis, cujas vivencias são desafiadoras nesta aldeia global. Trouxeram considerações sobre a situação das mulheres no contexto da pandemia do coronavírus e estratégias que se valeram a população LGBTQI+ para amenizar quadros de violências acentuados no período. Apontam para informações sobre as mulheres transexuais, travestis e outros sujeitos vulneráveis que estão muito mais expostas no período pandêmico.

Fernanda Abreu de Oliveira no artigo “O adeus precoce: a morte de mulheres grávidas e puérperas como violação de direitos humanos e prática da necropolítica no Estado brasileiro” informa que o universo de fatores de desigualdades entrelaçadas ou interseccionadas, as condições gravídica e puerperal demandam cuidados e uma oferta qualificada a específica de serviços estatais em relação aos quais o Estado Brasileiro tem falhado terrivelmente em ofertar. No tocante em particular aos direitos sexuais e reprodutivos, avulta no Brasil da atualidade a sua condição de país onde mais morrem mulheres em estado gravídico e puerperal, com indicativo de oferta de um serviço de saúde deficitário, qualitativa e quantitativamente incompatível com as normas que regem sua oferta. Uma tal prática estabelecida pelo Estado Brasileiro, que desconsidera inclusive os gravames de saúde decorrentes do contexto pandêmico, mostra-se claramente violadora dos direitos humanos sexuais e reprodutivos das mulheres.

Francisca Nayana Dantas Duarte “Isolamento social, quarentena, lockdown e violência doméstica? uma análise sobre o aumento de casos de agressões contra a mulher em tempos de pandemia” fala sobre o aumento da violência doméstica durante a pandemia do novo corona vírus e aponta programas e campanhas foram desenvolvidas como forma de apoiar mulheres inseridas em um contexto de violência.

Gisele Meneses do Vale e Júlia Helena Sousa no artigo “O encontro das pandemias: como o período de isolamento social deu luz à intensificação da violência doméstica”, aponta para várias questões que se interligam para relacionar a violência doméstica no contexto pandêmico e informa que Governo Federal fez um desserviço na votação do relatório do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas sobre discriminações contra mulheres e meninas na qual decidiu abster-se da votação, ladeado de países ultraconservadores quando se trata dos direitos das mulheres, tais como: Egito, Paquistão e Arábia Saudita.

Heloísa Helena Silva Pancotti e Renato Bernardi “A proteção da gestante trabalhadora e o enfrentamento ao covid-19: entre a proteção e o desamparo social” trouxeram o recorte metodológico da mulher gestante e as implicações que se relacionam à sua condição física. Fizeram observação sobre o modo como a previdência social trata das incapacidades para o trabalho e os benefícios elegíveis e analisaram por meio do exame dos requisitos para a concessão do Benefício por Incapacidade Temporária.

No texto “A atuação estatal na efetivação do direito à saúde da gestante e da criança durante o SARS-COV-2’, as autoras Hemily Samila da Silva Saraiva e Rebeca de Souza Barbalho nos dizem que quando o Estado-Administração falha no dever Estatal, no sentido de ausência ou incompletude na atuação dos serviços públicos, se constata uma omissão, uma ineficiência do Estado, não podendo fundamentar essa prática na teoria da reserva do possível. O Poder Judiciário entra em cena pela natureza de sua função, o que se pode denominar de controle jurisdicional das atividades administrativas. Diante da necessidade desse empenho ao atendimento para as pessoas em situações de COVID-19, notadamente as gestantes e as crianças, o Ministério da Saúde e a Recomendação n.º 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça, classificou ambos como “grupo de risco” reconhecendo a vulnerabilidade inerente a eles. A legislação pugna por serviços públicos efetivos e adequados para abranger, de forma preventiva, bem como as que atendam as gestantes e as crianças que passaram a ter sintomas da doença, objetivando tutelar o princípio da dignidade da pessoa humana que é o centro do ordenamento jurídico brasileiro.

A professora e pesquisadora Hilda Helena Soares Bentes em “Breves reflexões sobre “a confissão de leontina”: a violência contra a mulher como “uma epidemia”, desenvolveu uma leitura do conto “A confissão de Leontina”, de Lygia Fagundes Telles, como representação da violência contra a mulher, com um olhar investigativo voltado para o pensamento de Luis Alberto Warat e de algumas autoras feministas, especialmente quanto à questão da ética da alteridade como premissa básica para os direitos humanos das mulheres.

Hizadora Constanza Medina D’Ambros, Izabela Medina D’Ambros e Patrícia Medina ao escreverem sobre a “Fenomenologia do cuidado: reflexões sobre e a condição humana no cenário de pandemia COVID-19” acreditam que uma releitura epistemológica sobre as ligações entre as condições humanas e resposta da construção do conhecimento se impõe, visto que esse laço está também na base das doenças  que afrontam a qualidade de vida singularmente.  A valorização de uma abordagem, tanto teórica quanto prática, ligada a uma visão ao mesmo tempo integrativa e respeitosa das diferenças particulares dos sujeitos permitiria a melhora da qualidade da realização e eficácia das intervenções (científicas e pessoais) nesta mesma dimensão e por conseguinte social.

Izabella Barros-Melo no seu artigo intitulado “Entre símbolos e retribuições: sobre as tensões políticas no enfrentamento aos delitos motivados pelo gênero” trouxe a discussão sobre a crise pela qual atravessam a pena e o sistema penal democrático, quanto à racionalidade legislativa, tão responsiva às demandas pelo controle da criminalidade, mas tão pouco disruptiva quanto aos caminhos que apresenta para se alcançar esses fins, tomando como foco de discussão o feminicídio contra mulheres, num debate que coloca de um lado mais ou menos punitivista. Diz que se deve evitar a utilização simbólica do para se buscar os caminhos menos tortuosos no sentido de se encontrar as reais alternativas ao enfrentamento de um conflito social tão crítico e para resumir a instrumentalização e a capitalização política em cima do sistema punitivo

Isadora Petronila Cavalcanti Silva Ramos e Raissa Lustosa Coelho Ramos na abordagem sobre “Garantia de renda e formas de autonomia para mulheres durante e depois da pandemia”, fizeram estudo da crise na perspectiva da pobreza e da desigualdade de gênero. Demonstraram que a ferramenta da renda básica poderia agir no centro das desigualdades sofridas pelas mulheres na sociedade, para lhes proporcionar mais dignidade e autonomia. Essa medida, além de ser eficaz para atravessar a instabilidade atual, ainda proporcionaria uma perspectiva futura de garantia de direitos – durante e depois da pandemia.

 Jessica Holl, Raquel Cristina Possolo Gonçalves e Rayann Kettuly Massahud de Carvalho escreveram sobre “Desigualdade de gênero em tempos de pandemia: uma disputa pelos sentidos da constituição” refletiram sobre as formas de manifestação que as desigualdades de gênero assumem hodiernamente, bem como buscaram compreender o lugar que ocupa a Constituição, enquanto categoria teórica-social relevante na modernidade para compreender a supracitada tensão. O reconhecimento de que as desigualdades de gênero estão sendo potencializadas em diversas frentes — nos trabalhos de cuidado, na divisão social e sexual do trabalho, na esfera da participação política, no acesso à saúde — aparece como resultado da, ao mesmo tempo que é essencial para manter a disputa pelo sentido e significado da Constituição.

 

Joanna Victória Amaral Mendonça, Patrícia Verônica Nunes Carvalho Sobral de Souza e Rebeca Jamilly Costa Souza apresentaram informações sobre “Mulheres na linha de frente durante a pandemia: o abalroamento de funções frente ao desamparo político-social”, ao analisarem condições de trabalho que essas profissionais da linha de frente estão submetidas. Identificaram que, diante da pandemia, os ambientes de trabalho demonstram condições de vulnerabilidade e colocam os profissionais em risco de exposição, tornando-o também um local de insegurança, estresse e risco à saúde mental. Informam ainda que as consequências da pandemia são mais extensas do que fora mensurado inicialmente pelo Governo Federal. Instalou-se no Brasil, uma verdadeira crise sanitária que beira também a uma crise político-econômica. O desamparo do Estado a população de modo geral, aos comerciantes e principalmente aos profissionais da linha de frente, em destaque as mulheres; desencadeia uma série de efeitos negativos para o combate eficaz a COVID-19.

João Paulo Allain Teixeira e Katherine Lages Contasti no artigo intitulado “A pandemia das mulheres nas atividades legislativas do congresso nacional em contexto de COVID-19” argumentam que a  experiência da pandemia por COVID-19 na Améfrica Ladina é marcada pelo escancaramento das desigualdades estruturais e o sentido do comum não só na convivência, como de sua instrumentalização e de toda experiência de formação de povo, democrática ou não, segue sendo atravessada pela política de morte. Fizeram um mapeamento sobre a produção legislativa e questionaram como esses projetos de lei têm respondido à violência doméstica.

Júlia Tormen Fusinato e Laura Gigante Albuquerque intitularam sua análise de “Estamos todos no mesmo barco?”: perspectivas de gênero sobre a pandemia”, que comporta uma visão sobre propõem a categoria “gênero” para possibilitar uma reflexão multidimensional sobre o fenômeno da pandemia. Propuseram uma perspectiva que não invisibiliza ou exclui a experiência das mulheres no contexto pandêmico. Informam que o vírus não é democrático e levantam a tese de que as consequências do coronavírus atinge as pessoas de diferentes maneiras. Reiteram que a pandemia intensificou e evidenciou as desigualdades dos grupos histórica e socialmente vulneráveis. No tocante às mulheres, perceberam que a distribuição desigual do trabalho doméstico e de cuidados agravou-se ainda mais no contexto de pandemia.

Karen Graciella Gonçalves da Silva em sua contribuição para a presente coletânea escreveu um ensaio sobre “Trabalhadoras domésticas no cenário brasileiro de pandemia” enfoca a questão do trabalho reprodutivo exercido por mulheres negras em razão de trabalharem como domésticas. Ao final, espera que a questão racial se integre definitivamente no movimento de mulheres e que essa luta impulsione a construção de um modelo civilizatório humano, fraterno e solidário que expressem a luta antirracista, feminista e ecológica

Kátia Alexsandra dos Santos e Michele da Rocha Cervo no artigo “Mulheres e mulheres na pandemia: os diferentes sentidos de “ficar em casa” refletem sobre as diferentes e divergentes experiências das mulheres durante o período da pandemia pelo novo coronavírus e trazem um questionamento importante: qual seria uma política de contágio para resistir ao vírus e aos devires históricos ligados à condição de gênero?

Katie Silene Cáceres Arguello no artigo “Hiperencarceramento feminino em tempos de pandemia” relaciona os efeitos sociais que solidão da pandemia ocasiona comparando-os aos efeitos do hiperencarceramento e percebendo que a situação das mulheres detentas sofre um agravamento em razão de negligência histórica do poder público com o sistema prisional.

Larissa Rahmeier De Souza  e Letícia Maria Gonçalves Santos no texto “Trabalho doméstico e desproteção previdenciária: necessidade de um olhar interseccional” trazem mais um olhar interseccional sobre as trabalhadoras domésticas no período da pandemia e reforçam que o Estado Democrático de Direito deve ser capaz de garantir ampla proteção jurídica e dar respostas à precariedade da integração das trabalhadoras domésticas à Previdência Social.

As autoras Laura Marconi Bastos e Maria Luiza Prestes Magatti no ensaio sobre “Flexibilização da quarentena: os reflexos da economia capitalista na maternidade solo”, trazem um importante debate interdisciplinar ao apontarem que nos contextos fáticos que envolvem dívidas de caráter alimentar não há qualquer respaldo do Estado para a promoção da subsistência de crianças e adolescentes que deveriam ter seu desenvolvimento estimulado materialmente por ambos os genitores, mas, por negligência paterna, tornam-se dependentes exclusivamente dos rendimentos da mãe. Analisaram a relação entre o exercício da maternidade solo e a retomada econômica na fase de flexibilização da quarentena durante o contexto pandêmico e perceberam a falta de assistência do Estado para a realidade das famílias monoparentais.

Laura Souza Lima e Brito,  Luiza Nobre Maziviero e Luma Cavaleiro De Macêdo Scaff ao escreverem sobre “A conferência de Pequim e a proteção das mulheres durante a pandemia da COVID-19” trouxeram a importância  da Conferência de Pequim enquanto orientadora à proteção das mulheres durante a pandemia da COVID-19 com as seguintes referências internacionais que devem orientar a resposta à pandemia:  o conceito de gênero como resultado de uma perspectiva social, cultural e histórica, que levou em conta os papéis socialmente atribuídos às mulheres em todos os aspectos das relações humanas; o reconhecimento da desigualdade no acesso à educação e à capacitação; a sabida desigualdade quanto à participação nas estruturas econômicas, nas atividades produtivas e no acesso a recursos; e a gravidade da violência contra a mulher.

Lidiane Lima Silva e Luciana Santos Silva no artigo “Atuação da clínica de Direitos Humanos da UESB na tutela de direitos das gestantes na pandemia” verificaram em pesquisa que as maternidades da cidade de Vitória da Conquista e do Estado da Bahia, por meio da norma técnica 69, instituíram violação ao direito a acompanhante durante o parto ao arrepio da lei e das recomendações emitidas pela Organização Mundial da Saúde e Ministério da Saúde. Indicaram também que o Poder Judiciário vem reconhecendo a ilegalidade dessa prática, pois já existem decisões judiciais garantindo o direito de todas as gestantes a um acompanhante antes, durante e depois do parto, ainda em tempo de pandemia da COVID-19. A pandemia não permite afastar o postulado da dignidade da pessoa humana e, portanto, a vedação de direito ao acompanhante viola direito humano das mulheres, o que ensejou a intervenção da CDH/UESB que optou pela advocacy como estratégia de atuação.

Luíza Trindade Freire e Rhayssa Ferreira Gonçalves Santos ao escreverem sobre “A restrição ao direito de acompanhante no parto ante a pandemia do COVID-19: uma violação à dignidade da mulher ou uma proteção necessária?” trazem uma abordagem sobre a questão do direito de acompanhante no parto e atestam sobre a necessidade da parturiente ter o direito à presença de acompanhante no delicado momento do parto.

Maria Aparecida Figueirêdo Pereira e Verônica Figueirêdo Pereira no texto “A COVID-19 e o que as aulas remotas, remontam para professoras do ensino fundamental em Campina Grande-PB” a partir de relatos sobre a professora de nome fictício Atena, fazem um panorama do que significou o impacto das aulas remotas no dia a dia de  mulheres professoras. Refletiram sobre o quanto a pandemia impacta diretamente às mulheres no que se refere a feminização das profissões que ocupam, principalmente, trabalhos que culturalmente lhes são atribuídos: enfermagem, magistério assistência social, atividades que presumem o cuidado com o outro, o provimento de serviços sociais, sobretudo com enfermos, idosos e crianças

Maria Cristina P. Pechtoll, Silmara Conchão e Sonia Alves Calió no artigo “Relendo a cidade sob a perspectiva de gênero: as gestões feministas na Prefeitura de Santo André entre 1989 e 2016”, a partir de estudo de caso, demonstram que os organismos que envolvem gestão de gênero têm de se articular com os outros setores e promover políticas integradas.  Apontam para um caminho: a construção de políticas de gênero é um processo, sobretudo pela complexidade das mudanças que isso traz. Implica em mudanças na própria organização da sociedade civil, na organização da máquina pública, implica em mudanças de ordem econômica, social, política e, sobretudo, cultural. Em um ano eleitoral como o de 2020 é essencial que as mulheres escolham representantes públicos que estejam alinhadxs com a perspectiva de gestão feminista.

As autoras Maria Eduarda Gobbo Andrades, Maria Júlia Lima Pereira e Natália da Silva Lima ao tratarem sobre “Gênero e raça ante a pandemia da COVID-19: a flexibilização do direito à vida em tempos de crise” apontam que a resposta estatal à pandemia da COVID-19 leve em consideração questões de gênero e raça, para que as mulheres negras, mais vulneráveis ao contágio do vírus e com menos acesso à saúde, não percam suas vidas e as de seus familiares por negligência do Estado e não se encontrem ainda mais vulneráveis, pelo desemprego, após este período de crise

Maria Helena Franca Neves ao escrever sobre “Antígonas da pandemia”, em texto filosófico, visualiza na mulher a condição de Fenômeno Total, do qual emerge um ser capaz de incorporar na unicidade do seu próprio ventre em gestação, a multiplicidade de sujeitos, a capacidade de desenvolver uma vida social que requer doses muito elevadas de disposição para ouvir, muita capacidade de suportar, desdobrar-se, de servir e acima de tudo uma notável capacidade de viver e de ajudar a viver. A autora aponta quatro projetos sociais destinados a mães em situação de vulnerabilidade social e constrói uma narrativa que coloca como obrigação das orientações científicas de combate ao coronavírus o envolvimento com a responsabilidade ética enquanto barreira contra a contaminação.

A autora Maria Júlia Poletine Advincula no artigo “Violência doméstica: medidas protetivas de urgência, acesso à justiça e subnotifcação no contexto pandêmico”, fez entrevistas com a equipe multidisciplinar da  2ª Vara da Mulher do Recife e inferiu que no período dos meses de abril a julho de 2019 e 2020, comparativamente, os números de pedidos de medidas protetivas diminuíram. Alega que as mulheres, presas em seus lares, encontram mais outro dificultador para requererem proteção estatal e que, portanto, os números não refletem a realidade social concreta.

O artigo produzido pelos autores Maria Júlia Poletine Advincula e Túlio Vinícius Andrade Souza “Muito além do vírus: a Lei Maria da Penha e as múltiplas vulnerabilidades enfrentadas por mulheres transexuais no contexto da pandemia” trazem a discussão das vulnerabilidades das mulheres transexuais durante o período pandêmico. Falam sobre a lacuna institucional para sistematizar os dados sobre as mortes das mulheres trans e travestis e reiteram que a política de omissão quanto a essa parcela está relacionada ao reflexo da omissão institucional que permeia esses corpos.

Marly Perreli no seu artigo “Atrás das máscaras: mulheres na linha de frente da COVID-19” traz questionamentos sobre a situação das mulheres no combate ao coronavírus. No contexto de emergência de saúde pública, acredita que a atuação das profissionais pode apresentar desequilíbrio psicológico extremo, chamado fadiga de compaixão ou trauma vicário.

No artigo escrito conjuntamente pelas autoras Mayana Sales Moreira, Samyle Regina Matos Oliveira, Selma Pereira de Santana intitulado “Aumento da violência contra mulher a partir do início da pandemia da COVID-19: propostas de enfrentamento”, inferem que a análise sobre os três eixos da Lei Maria da Penha, no que concerne à proteção da vítima, a prevenção da violência e a responsabilização do ofensor, bem como acerca dos dados fornecidos pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, observados, sobretudo, após o início da Pandemia pela COVID-19, permitem discutir algumas possibilidades de enfretamento da questão como a Justiça Restaurativa e outras ações de apoio aos autores e às vítimas da violência. Afirmam que a Justiça Restaurativa, assim como os Grupos Reflexivos e de Apoio às Mulheres que utilizam técnicas da JR, podem ser, perfeitamente, mecanismos capazes de abraçar a complexidade dos elementos relacionados à violência contra a mulher no período pandêmico.

Patrícia Verônica Nunes Carvalho Sobral de Souza, Sirley Meclaine da Graça Melo e Thiago de Menezes Ramos sobre “O direito à saúde das pacientes no Brasil no contexto da pandemia da COVID-19” investigaram a proteção do direito à saúde das pacientes no contexto da atual pandemia da COVID-19. A crise sanitária evidencia a importância da proteção do direito à saúde e da adoção de medidas para a sua promoção por parte dos Estados. Percebeu-se que a vulnerabilidade das mulheres é acentuada, na medida em que as necessidades específicas das pacientes também são afetadas pelos problemas sanitários atuais.

Renato Bernardi e Sandy dos Reis Silva ao escreverem sobre “Mães de todos, sujeitos de ninguém: análise das empregadas domésticas brasileiras sob a ótica da maternagem e desigualdade racial” reiteram que fatores como gênero e raça são determinantes em nosso país para definirem os padrões de desigualdade e exclusão social, tais como no mercado de trabalho, no qual as mulheres, especialmente as negras, vivenciam as situações mais desfavoráveis ao terem suas possibilidades de acesso ao emprego. Trazem ainda perspectivas para falar sobre a experiência de existência de maternidade e da ausência de maternagem que atinge as empregadas domésticas brasileiras provém de uma vivência escravagista, racista e classicista, pois as mães negras, brasileiras e domésticas se tornam a base e o elo de força das famílias de seus empregadores, mas não dispõe dessa mesma vivência com seus filhos biológicos.

Rachel Pereira Dias Calegario ao escrever sobre “Pandemia, patriarcado e estética: uma abordagem histórico-filosófica do “ser mulher” num paralelo entre Gilda de Mello e Souza e Clarice Lispector” parte da concepção histórico-filosófica do “Ser Mulher” no contexto da pandemia da COVID-19, através do retrato apresentado por uma sociedade patriarcal. Na estética, através de uma conexão entre Gilda de Mello e Souza e Clarice Lispector, faz a leitura sobre o sentido do termo “Ser Mulher”.

Romilda Maria de Jesus e Susilene Ferreira de Oliveira no texto “A mulher negra em tempos de pandemia” a partir de relatos de solidão de duas mulheres negras ativistas de Uberlândia-MG, as autoras realizaram entrevistas on-line com outras mulheres e perceberam, a partir da escuta, as vivências e experiências de mulheres negras neste período de pandemia. Observaram que neste período pandêmico vem ocasionando uma grande transformação de comportamentos.

Tássia Louise de Moraes Oliveira ao escrever sobre “A concessão e fiscalização das medidas protetivas de urgência durante a pandemia causada pelo COVID-19”, percebe que em decorrência do isolamento social imposto, a pandemia trouxe como efeito secundário o aumento da violência doméstica contra as mulheres. Tal majoração explica-se por diversos fatores de vulnerabilidade social, econômica e de gênero, potencializados pela pandemia, que dificulta consideravelmente o acesso das vítimas aos meios oficiais de denúncia, orientação e encaminhamento.

Os recortes temáticos ficaram enumerados nas seguintes perspectivas de abordagens teóricas: direito das mulheres quilombolas, direitos das mulheres imigrantes e refugiadas, a questão do isolamento da mulher e as repercussões em sua saúde, o aumento da violência doméstica que contou com cinco textos distintos,  a questão dos marcadores interseccionais de classe, raça e gênero tiveram seis artigos, dois artigos sobre o Legislativo e as normas de proteção às mulheres, a abordagem sobre a questão das mulheres trans foi apresentada em dois artigos, cinco artigos trataram sobre as mulheres grávidas, a questão do direito do trabalho e renda para mulheres ficou evidenciado em duas análises, a ética da alteridade foi colocada a partir da filosofia, da literatura e da estética, a epistemologia do cuidado e o autocuidado da mulher, textos sobre mulheres encarceradas apareceram duas vezes nesta coletânea, as mulheres na linha de frente no combate ao vírus, trabalho doméstico das mulheres ficou evidenciado em três abordagens distintas e que dialogam entre si, a inter-relação entre a maternidade solo e a pandemia, os direitos internacionais de proteção às mulheres, o ensino tele presencial e os efeitos nas vidas das mulheres, a gestão feminista no espaço público, a justiça restaurativa no contexto da violência contra a mulher.

No volume 03 de “Pandemia e Mulheres” concentraremos todos os artigos sobre o eixo “política feminista no combate aos impactos do coronavírus”. Para tanto, precisaremos identificar projetos ou atuações concretas que possibilitem uma melhoria na vida das mulheres das diversas regiões do país. Por último, um agradecimento especial às organizadoras Carla Estela Rodrigues e Maria Júlia Poletine que foram fundamentais para que essas obras fossem finalizadas e pela parceria nos projetos coletivos, a artivista plástica Lia Testa que tem produzido colagens para nossas capas e também para a identidade visual do Observatório das Mulheridades, à Editora Studio Sala de Aula, na pessoa do Prof. Belmiro Fernandes, e às autoras e autores que assinam o conjunto destes dois primeiros volumes da coleção.

 

 Sertão do RN, agosto de 2020.

Ezilda Melo