LANÇAMENTO:
APRESENTAÇÃO
“As sociedades mais atrasadas são aquelas
em que as mulheres estão submetidas. No entanto, essa verdade evidente é
frequentemente ignorada pelos governos e pelas organizações sem fins
lucrativos. Por sorte isso está mudando à medida que mais mulheres têm poder de
decisão política ou recursos para a filantropia, que em geral são destinados a
projetos femininos”. Isabel Allende. In: Mulheres de minha alma. Pág. 137
A presente obra coletiva traz abordagens que se relacionam
diretamente com os direitos fundamentais das mulheres. Os artigos estão
contextualizados no período do enfrentamento à maior pandemia vivenciada por
nossa geração e que trouxe inúmeros problemas que se ligam com a vida e os
direitos das mulheres. Os 16 artigos dessa coletânea possibilitam diversos olhares
e são continuidade às obras coletivas “COVID-19 e Direito Brasileiro: mudanças
e impactos”, “Pandemia e mulheres: volume 01 e 02”, “Maternidade e Direito”,
“Maternidade no Direito Brasileiro”, vez que como organizadora desses trabalhos,
que contaram com muitas vozes e mãos, pesquisas e denúncias, apoio coletivo,
estamos numa batalha coletiva por uma visibilidade sobre a questão dos direitos
das mulheres.
Com
a publicação de “Pandemia e Mulheres: volume 01 e 02”, com mais de mil páginas
de escrita coletiva, evidenciou-se que os reflexos da pandemia nesse grupo
vulnerado teve, e continua a ter, muito impacto. Com essa visão sustentada nas
pesquisas destas duas obras fizemos uma divulgação do material que contou com o
apoio da ABRACRIM, que além de ter promovido lives para encontros discursivos
sobre a temática, também possibilitou que os artigos tivessem um alcance maior,
através de seu site. Paralelamente, foi criado o Observatório das Mulheridades,
em algumas plataformas virtuais, a exemplo de conta no Instagram e blog com o
mesmo nome, atuando durante o período eleitoral, com o intuito de contribuir
para o debate político, vez que em outubro de 2020 tivemos uma importante
eleição para os municípios brasileiros e a pauta dos direitos das mulheres era
(é) premente.
Com isso, abrimos diálogos com mulheres
parceiras do projeto de escrita para dar visibilidade a candidaturas
comprometidas com os direitos das mulheres, como Nilda Câmara, Mirian Monte e
Andrea Marques. Todas três feministas, com propostas inclusivas e sociais.
Nilda Câmara, professora aposentada
da UFCG, desde os anos 80 já participava ativamente dos movimentos populares.
Sua candidatura foi indicada por um grupo de mulheres do Partido dos
Trabalhadores. Por respeito e cuidado com a saúde do Outro, a própria saúde e
de sua família, fez toda a campanha via redes sociais, contou com um grupo de
50 pessoas que apoiaram a candidatura, recebeu depoimentos de agradecimento por
ouvir vários setores da sociedade, e por ter a coragem de se colocar como
candidata. Obteve 844 votos, sendo a segunda mais votada do PT em Campina
Grande, porém não foi eleita. Em 2020, Andrea Marques foi candidata pela 1ª vez
ao cargo de vereadora na cidade de Salvador pelo partido Rede Sustentabilidade.
Em 2018, tentou a vaga de deputada estadual pelo Partido Verde. Obteve muito
menos votos que o esperado e percebe que há muitas dificuldades para que as
mulheres façam política na atual conjuntura. A voz da mulher na política, mesmo
potente, requer ouvidos atentos, mas esses ouvidos estão tão acostumados com o
machismo, com o patriarcado, com o universo capitalista opressor, que sequer
percebem as práticas perniciosas dentro da própria estrutura partidária. Pela
sua experiência, a existência e a permanência das mulheres na política é muito
difícil, sendo necessária uma verdadeira alteração na formação da estrutura
social. Acreditar na possibilidade dessa mudança e apoiar verdadeiramente as
mulheres nos espaços políticos, é o primeiro passo para o fortalecimento da
mulher nas eleições. Mirian Monte, candidata à vereadora em Maceió, analista
judiciária, aliou sua poesia e arte às suas bandeiras políticas. Apesar de bem
votada, também não se elegeu, mas hoje exerce a Presidência da Fundação
Municipal de Ação Cultural de Maceió e, portanto, está com atuação na esfera
pública. Acompanhando a atuação política destas três mulheres, no contexto
pandêmico, ficou evidente o quanto de dificuldades tiveram para fazer suas
campanhas pelas vagas no legislativo.
A questão política tem total relação
com o contexto da pandemia, vez que se não tivermos representantes com esse
olhar inclusivo e aguerrido com os direitos fundamentais das mulheres, os
problemas que as envolvem se agravarão, pois se trata de grupo vulnerado
historicamente e no contexto atual lidam com questões que envolvem sobrecarga
do trabalho doméstico, falta de estrutura escolar para suas crianças,
desemprego crescente, cuidado com os infectados com o vírus da COVID-19,
violências e direitos reprodutivos.
Essa
obra é um mosaico de temas ricos e diversificados sobre a necessidade do
compromisso da atuação jurídica com perspectiva de gênero e preocupada com os
grupos vulnerados socialmente, dando evidência à questão das mulheres.
Precisamos unir forças, ocupar espaços públicos de poder, fazer campanhas,
mudar legislação, ofertar capacitação em gênero para o judiciário, acabar de
vez com o patriarcado cruel e melhorar as condições de vida de tanta gente que
está sofrendo as consequências danosas de uma ferida histórica e pela falta de
gestão de problemas que foram agravados pelo vírus da COVID-19.
É
nessa perspectiva de reconhecer problemas, denunciá-los, que essa obra se
constrói. Em cada fase da pandemia, mais complexas as situações se mostram.
Agora, vivenciamos a fase das poucas vacinas que atrasadamente, e sem
planejamento, estão sendo distribuídas à população. Essa obra é uma
contribuição para o debate dos direitos fundamentais das mulheres tomando como
pano de fundo o contexto histórico da pandemia, que está muito longe de ser superada
e há indícios fortes que no nosso país a necropolítica e a corrupção galopam
juntas nos pastos da desordem e do atraso. Faltou dinheiro para pesquisa, para
vacinas, para ciência, contrariamente tem sobrado para a indústria das fake news negacionistas e alienadoras. Falta
clareza e informações confiáveis sobre a pandemia, especialmente diante da decisão do governo federal de restringir o acesso a
dados, de tornar muitas informações sigilosas. Uma obra dessa natureza é
um ponto de luz na escuridão da desinformação. É uma gota d’água diante do caos
oceânico que vivenciamos no mundo e nos direitos das mulheres.
Ezilda Melo